A escrita e a pesquisa são preocupações constantes no Leite de Pedra. Eu sou Davi, participo do projeto, e minha função é coordenar a metodologia e epistemologia que chega na leitura e no sabor. Escrevo no Leite de Pedra desde sua concepção mais germinal. Pesquiso sobre cultura, sociedade e história mundial a fim de que possa transformar o doce numa propriedade comum da humanidade.
Já a Rafa é a pesquisadora central. Ela é quem cria a melodia, organiza a harmonia, faz o solo de guitarra, dança e ainda canta no palco.
Podemos dizer que meu trabalho é ajudá-la a alcançar a nota que ela deseja, aconselhá-la a encontrar o melhor timbre que combine com o ritmo, e mais importante de tudo, apoiá-la quando a crítica bate pesado e precisamos repensar nosso modelo de atuação.
Há muita coisa entre a panela e nossas mãos. Há muita coisa entre o pensamento e a ação. O Leite de Pedra todo ano faz aniversário, e entre cada aniversário há um mundo a ser vivido e explorado. A noção central desse texto é demarcar as principais influências para a teoria e a prática do leite de pedra.
Davi e Rafa na colheita do catolé Janeiro/2023 Pedra Branca- Ce
Nós somos pesquisadores. É preciso dizer com todas as letras, pesquisadores. Nós produzimos conhecimento, produzimos cultura e até produzimos história. Reza-se a lenda que também produzimos um doce secreto feito com base de coco e melaço de cana.
Há vários sabores que gostaríamos de tentar. Há várias ideias que gostaríamos de executar. Há várias aulas que gostaríamos de lecionar. Há vários cursos que gostaríamos de organizar. Enfim, há muito pelo que se fazer.
É nesse muito que percebemos o quanto também já fizemos, mas também o quanto ainda temos obrigação de fazer. O trabalho é árduo e há um mundo inteiro mudando ao nosso redor.
É preciso lembrar que a história das coisas não dura pra sempre. A história das coisas não dura sem a sociedade. Sem a sociedade as coisas do passado são apagadas no presente, e só resta o nada, o desconhecimento sobre nós e nossos antepassados.
Hoje os dias são conturbados. Mesmo com o desenvolvimento das ciências, ainda temos inúmeros problemas de base para solucionar. Hoje é preciso dizer um milhão de vezes que o ser humano nem sempre existiu. E mesmo que nem sempre tenha existido, ele não é o mesmo sempre. O ser humano muda, aprende, cresce e até mesmo cria outros iguais e diferentes a si mesmo.
Estudar a origem do ser humano parece algo muito complexo e distante, mas, nós do Leite de Pedra, temos a compreensão de que o nosso mundo é dinâmico e muda a cada instante. O presente vira passado, o futuro vira presente, e o que pensamos no agora virará o futuro. Sabemos as condições dramáticas pela qual a humanidade atravessa nos dias atuais. Sabemos o quanto as revoluções industriais e coloniais têm decidido a continuidade das formas de vida.
Por isso é importante sempre saber o que a ciência e a política tem planejado para nós e saber se movimentar com base nas mudanças. Esses valores garantem, não apenas a honestidade do fazer, mas, principalmente, a solidariedade humana tão necessária para superarmos os problemas.
Essas se tornaram as principais propostas do Leite de Pedra. Pode parecer estranho, mas o Leite de Pedra não é apenas um projeto de comer. Ele tornou-se uma pesquisa que tem por objetivo descobrir como atuar e melhorar as condições humanas e naturais do nosso planeta. Mas não podemos fazer isso sozinhos, é preciso unir as ideias e as mãos de todo um povo para alcançar a felicidade.
Sabemos que o doce no Brasil se reproduz na palavra, no desejo e até na recusa de lembrar-se do seu passado. Hoje a identidade brasileira entra em mais uma crise. Hoje não aceitamos todos os estereótipos criados para “inventar” um ser brasileiro. Hoje nos questionamos novamente “quem somos nós”.
Hoje é um lindo dia para se inventar um novo Brasil.
Para fazer tudo isso, procuramos entender, assim como uma raiz busca alcançar água e estabilidade, o que significa o Brasil. Esta busca nos leva ao interesse profundo acerca da essência antropológica do viver, os limites da transformação da cultura e, acima de tudo, como impedir o fim do mundo natural.
Houveram outros cataclismas na nossa terra, mas sabemos que este tem uma característica essencial. Neste, nós estamos aqui e podemos fazer algo para mudá-lo. Nossos dias são cada vez mais uma luta pelo espaço e pela vida. Nossos dias mudam, nossa sociedade muda, nós mudamos. O Leite de Pedra muda.
Mas nós queremos crescer. Queremos ter muitos anos de idade. Ter milhares de amigos. E escrever milhões de textos.
A pesquisa do Leite de Pedra é antes de tudo para incentivar outras pessoas a escreverem. O Leite de Pedra foi fundado como uma pesquisa da identidade do Ceará. Mas, com várias contradições e antagonismos locais, percebemos que há problemas que são até maiores que o próprio Brasil presentes no doce.
Hoje é a história do mundo que nos chama. Hoje a vida, o trabalho, a emancipação humana são os mistérios que nos movem a pensar e a agir. E tudo isso ocorre enquanto se quebra o coco, mexe a panela e embala doces.
É um trabalho difícil, mas recompensador. Se a arte fosse fácil talvez não fosse tão bela. Entretanto, isso não é um elogio à dificuldade. Toda plantação é difícil enquanto não vem a colheita. Nosso objetivo é colher e semear junto com a sociedade humana os propósitos da vida, da cultura e do pensamento. Para isso, precisamos plantar as ideias, colher os sabores e comunicar as lembranças.
Hoje queremos ser autônomos. Hoje tiramos Leite de Pedra para que todos um dia possam provar do “Doce de Pedra” tirado com as próprias mãos. Assim, buscamos incentivar todos do mundo a escreverem suas histórias, buscarem seus desejos imaginários e perseguirem a fagulha da vontade pelo brilho da liberdade.
Fazemos o Doce de Pedra, escondendo por detrás do sabor a vontade lê-los e provar as muitas doçuras que nossos amigos podem fazer. O futuro será doce enquanto a humanidade souber tirar os seus “Leites de Pedra”.
Afinal, devemos lembrar que o nosso planeta é, antes de tudo, uma grande Pedra caminhante.
Obs: Se você quiser saber qual os ingredientes mais importantes do doce, aqui vai uma dica: usa-se água e terra, o resto deve ser inventado pelas mãos de quem cozinha.
24 de Outubro, 2023. Davi Amaral, companheiro do fogão das ideias e dos prazeres.
Davi além de coordenador de pesquisa do leite de pedra, lavador de louça oficial, fechador de muita caixa de doce viajante é meu melhor amigo e amor que nunca deixa eu desistir de realizar nossos sonhos. Esse é nosso primeiro fim de ano na nossa casa só eu, ele e quatro gatas. E apesar de toda dificuldade atravessada, juntes a gente sempre termina bem, caçando pokemon online, comendo um docinho e dando boas risadas.
Esse texto foi impresso e enviado com todos os pedidos da Safra Amuleto, em dezembro, juntamente com um postal lindo feito pela ilustradora Mona Carvalho e o inventário dos sabores&safras do Leite de Pedra. A lista do inventário estará disponível aqui no blog junto da nossa última carta aberta do ano, que sai dia 30 de dezembro.
Presentinho: receita de cocada de forno& o E-Book Natal á Literatura Brasileira por Gastrolité
cocada-queimada de Leite de Pedra sabor especial da Safra Amuleto inspirado na cocada de forno.
Uma grande alegria poder fechar mais um ano escrevendo e fazendo doce. A convite da minha amiga querida e escritora Jane Lutti do Gastrolité, me juntei a uma galera foda, compartilhando receitas inspiradas em obras e autores da literatura brasileira.
O E-BOOK além de incrível de lindo está disponível pra download gratuito!!! Presentim pra inspirar as festividades dos derradeiros dias do ano.
pra baixar o E-BOOK completo com todas as receitas e textos clica aqui.
Cocada de Forno: receita e segredos.
É a sobremesa favorita do Davi e eu sou uma grande admiradora do ofício de cocadeira. Porque? Já errei muito o ponto do tacho da cocada e o choro foi grande. É difícil acertar na cocada de “primeiras”, coisa que só o tempo e a maestria das mais velhas sabe bem. Como toda doçaria nativa, cada cocada tem um sabor único do lugar de origem de quem planta e cozinha. A minha versão de forno foi o mais próximo que eu já cheguei de uma cocada bem feita. Espero em breve visitar uma amiga doceira da serra da Aratuba, Dona Vilany, que faz as melhores cocadas que já provei aqui no Ceará. Aprender com ela esse ofício tão rico é um privilégio pra vida toda. Saudade do sorriso dela e das nossas conversas no pé da feira.
A receita pro E-BOOK tem um toque especial de cumaru e rapadura, inspirado em Cora, a poetisa doceira mais amada desse Brasil e que tanto me acompanhou nas jornadas de luta desse ano.
trecho do ebook Natal á Literatura Brasileira por Gastrolité
Boas festas pessoal! Muito amor, saúde, uva passa na farofa e aquele docinho compartilhado com gente querida. Viva!
um xero lambuzado de cocada, e até proximo encontro.
Rafa Medeiros.